"Já choramos muito, muitos se perderam no caminho. Mesmo assim, não custa inventar uma nova canção que venha nos trazer sol de primavera... Quando entrar setembro..." (Beto Guedes)

quinta-feira, 19 de maio de 2011

A grande ironia da evolução humana



Anderson Cristiano da Costa

www.temasanderson.blogspot.com









A evolução humana se parece muito com um terreno muito íngreme, sobre o qual alguém caminha com dificuldades e, subitamente, pisa numa pedra solta e despenca lá de cima rumo ao abismo que deixou para trás.







Estamos ainda em ascensão, melhor dizendo, uma ilusão de ascensão, já que o instinto predatório animalesco ainda predomina sobre a racionalidade um dia compreendida como responsável — racionalidade que não passa de pensamento inconseqüente. A voracidade do mercado, que instiga os desejos mais primitivos do ser humano, é uma das coisas que amplia essa animalidade inerente.

Estamos atualmente no tempo da satisfação de todas as paixões animalescas, o que vale é a lógica do “correr atrás daquilo que promoverá o maior prazer”.

Estamos em busca de um gozo constante, de uma orgia interminável de sensações extasiantes... Mas estamos em busca, mas nunca chegaremos a esse estado, e a lógica voraz do mercado sabe muito bem disso, e continua instigando a insensatez humana, com o intuito de alimentar obsessivamente a produção de supérfluos.

O que é inútil é elevado ao status de indispensável. O que é indispensável de fato é rebaixado ao status de insuficiente — é preciso que este esteja acompanhado de supérfluos para então garantir um pouco de sua efetividade.

Estamos muito confusos, incapazes de classificar de fato o que é necessário e o que é supérfluo.

Passamos horas no trânsito para chegar a um lugar específico e, então, agindo como escravos, garantir a licença para o consumo.

Arrebentamos o planeta para garantir a satisfação de nossos desejos insanos. Destroçamos pessoas para garantir o nosso prazer. Destruímo-nos para garantir que vamos ter o prazer de consumir um supérfluo.

Tudo deve ser prazer, tudo deve ser gozo!

Mas sabemos muito bem que nossa existência nunca foi e nunca será conivente com essa lógica insana, já que o desprazer é inerente à vida, porque ele nos leva ao movimento, à busca pela satisfação das necessidades — prazer e desprazer fazem parte da existência humana, não se pode fugir disso.

Mas as necessidades não podem ser satisfeitas completamente, pois isso levaria o ser à inércia. O mercado, o capital, sabendo disso, joga com essa característica da vida, e implanta na mente das pessoas a idéia de que existe uma forma de satisfazer todas as necessidades e desejos. Inaugurou-se então um sujeito sem freios, irreflexivo, que, de forma animalesca e tola, corre loucamente em busca de algo que jamais poderá alcançar de fato.

O ser humano da atualidade é um sujeito que deseja ardentemente mergulhar num lago de prazeres indizíveis. O ser humano da atualidade é um sujeito frágil, que tem dificuldades em lidar com as frustrações. É um sujeito que se sente limitado ao entrar em contato com o sólido, pois ele mesmo é líquido, ou seja, escorre de forma fácil e muito rapidamente pelo tempo, não conhecendo as paisagens, não ficando tempo suficiente para sentir os cheiros, a textura da vida. Ele sente que o tempo passa muito depressa, e que é preciso fazer muitas coisas, experimentar muitas coisas, para então saber o que é a existência. Mas, curiosamente, quanto mais foge da solidez, menos experimenta a essência do viver.

O ser humano da atualidade é um escravo, um autômato que segue ordens mesmo durante seu sono — que, nestes tempos, é bastante minguado. A ascensão humana revela então seu lado obscuro, inaugurando um homem que é mais primitivo — no sentido de animalidade — que seu ancestral que vivia em comunhão com uma natureza que, hoje, não passa de uma atração turística.





Abaixo, para ilustrar o que foi dito acima, uma parte de um documentário muito interessante. O documentário se chama "Da Servidão Moderna”, produzido por Jean-François Brient.
 
 

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