Num tempo de exaltação do ego, dependência é uma palavra "feia". Todos querem se orgulhar de serem independentes, sobretudo no que diz respeito às questões sentimentais. "Você não me ama? Ah é?" "Nem eu amo você, nunca amei e não estou nem aí...." Esse tipo de coisa. O ego é aquele sistema psíquico que baseia seu poder na percepção de sua própria independência. Independência da mãe e do pai, dos amigos, da mídia, da escola, do governo, independência de tudo. Ser independente é para o ego a condição de sua existência. Como dar conta então da dependência que surge toda vez que amamos?
Damos conta da seguinte forma: distinguindo entre dependências boas e dependências ruins. Há relações que nos deixam esgotados, há outras que nos fazem sentir mais fortes.
Há relações que requerem investimento contínuo e de mão única, outras em que as duas pessoas crescem e desabrocham. Existem relacionamentos que fazem com que nossa vida pessoal fique para trás, que percamos oportunidades e outras relações, que tiremos o foco de nós e o coloquemos somente na outra pessoa.
Amar é um forma de dependência, porque não só não escolhemos a quem amar como também não temos poder de deixar de amar. É ilusão de um ego infantil a de que se pode decidir deixar de amar. Ou não era amor de verdade e o sentimento simplesmente passou, ou é uma fantaisa que quer abafar a dor que a relação provoca. Quando amamos, a dependência surge pelo fato que não podemos ser completamente felizes sem a outra pessoa. A dependência positiva do outro não impede de viver e de viver bem. Podemos ainda assim ter prazer de viver, mas não aquela felicidade profunda que daria a presença do outro. Ao amar alguém dependemos da outra pessoa no sentido de que dependemos de sua existência, de seu bem estar, de suas opiniões, de seus sentimentos e de sua presença. Numa relação positiva, não há nada melhor do que isso: ter um ao outro e estar um pelo outro.
Esse tipo de dependência nos obriga a prestar atenção ao que queremos e a como queremos. Em relacionamentos equilibrados, o outro é visto como Outro e não como um pedaço de si. Consequentemente, se tende a ser e a dar o melhor de si, justamente por amor, por querer o bem. Conta-se com o outro e confia-se no ponto de vista do outro, apesar de vermos suas limitações e desafios. Amar é uma forma de cegueira inteligente. O amor é cego do ponto de vista do ego porque não é ele quem fez a escolha, mas o amor é inteligente porque enxerga o outro como Outro.
Nas dependências ruins, peças de um quebracabeça se unem no anseio de alcançar sua própria inteireza. Muitas pessoas estão deprimidas e esgotadas com a vida e pensam em encontrar alguém que irá dar-lhes afeto e companhia. "Irá dar-lhes...": a dependência negativa é essa daqui, baseada no projeto de receber antes mesmo de pensar em dar e no que dar. Há outras pessoas que dão em função de receber, dão dinheiro e/ou atenção para receber o mesmo (geralmente, criando uma dependência que poderia não ter existido).
Dependência ruim é a de casais que não conseguem fazer coisas separados, ou até mesmo passar umas horas sem se falar ao telefone. Com o tempo, a dependência se fortalece na exata medida em que ambos se enfraquecem como indivíduos.
Concluindo, podemos definir a dependência boa como aquele vínculo aprimora e enriquece os indivíduos em suas individualidades, e a dependência ruim como aquela relação que aprisiona o desenvolvimento individual e castra a subjetividade de cada um.
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