"Já choramos muito, muitos se perderam no caminho. Mesmo assim, não custa inventar uma nova canção que venha nos trazer sol de primavera... Quando entrar setembro..." (Beto Guedes)

segunda-feira, 9 de maio de 2011

SIGNIFICADO



- Quando eu morrer, verei o avesso do mundo.

O outro lado, além do pássaro, da montanha, do poente.

O verdadeiro significado, pronto para ser descodificado.

O que nunca fez sentido fará sentido,

O que era incompreensível será compreendido.





- Mas e se o mundo não tiver avesso?

Se o sabiá na palmeira não for um signo

Mas apenas um sabiá na palma? Se a sequência

De noites e dias não fizer sentido

E nessa terra não houver nada, apenas terra?





- Mesmo se assim for, restará uma palavra

Despertada por lábios agonizantes,

Mensageira incansável que corre e corre,

Corta campos interestelares, corta galáxias giratórias

E clama, reclama, grita.







Tradução

Mário Sérgio Conti





Czeslaw Milosz (1911-2004) 

Gosto desse poema do polonês Czeslaw Milozs, Nobel de Literatura, porque expressa a impressão popular de que após a morte o mundo finalmente fará sentido. Mas o que me chamou mesmo à atenção foi a confissão de seu desespero ao considerar a hipótese de que o mundo não tenha qualquer outro sentido senão o que está diante de nossos olhos aqui e agora: e se o sabiá na palmeira for apenas um sabiá na palmeira? e se não houver nada por trás da seqüência de dias e noites? Imagino que alguns religiosos sacariam, do coldre, a Bíblia, e despejariam sobre o poeta uma avassaladora saraivada de conceitos mostrando que é isso mesmo, no céu o mundo fará sentido, e depois tentarão confortar o poeta convidando-o a acreditar que Jesus poderá leva-lo para lá, o céu. Mas não posso ser contado entre eles.

(Ed René Kivitz)

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