A palavra
"desastre" tem uma origem interessante. Ela significa literalmente
"sem os astros" (des + aster). Os astrólogos gostam de um possível
significado disso: desastrada é a pessoa que contraria a necessidade do
momento, que vai contra o significado do momento. Significado este
hipoteticamente dado pela posição dos astros.
A crença deriva da
ideia de que cada momento tem uma tônica, e que é importante entendê-la olhando
para as luzes. Você não precisa acreditar em astrologia para apreciar as
implicações da palavra "desastre". Basta pensar que sempre existem
sinais que precisam ser observados, e eles podem estar na terra mesmo. Se eu
dirijo um carro e não estou atento à luz dos semáforos (e o semáforo é, num
sentido mundano, um astro, um luzeiro), o palco do desastre está armado. Se eu
olho meu exame de saúde e os astros do exame indicam que meu colesterol está
altíssimo, ou eu tomo uma atitude ou me lasco.
Não se trata de olhar
pra dentro, mas de olhar pra fora mesmo. "Olhar pra dentro",
"seguir sua intuição", tudo isso são frases de efeito bastante
valorizadas nos dias de hoje e, digo eu, superestimadas. Quem me garante que
quando eu olho pra dentro eu estou tendo um bom lampejo ou apenas sendo vítima
de minha própria vaidade e autoengano? Eu posso me achar muito sábio e
experiente, mas será que minha intuição sobrevive sem nenhum dado externo? Às vezes
eu preciso de dados externos! De astros! Pode ser, como já dei exemplo, um
exame de sangue: o hemograma é a constelação de sinais, sinais que me dirão o
que fazer, como proceder. Olhar pros astros é admitir: eu não sei tudo. Preciso
de referências.
Olhar pros astros não
precisa ser olhar para as estrelas e fazer mapa astral. Significa ter uma
referência, algo que seja maior que você, que seja anterior a você, que perdure
à sua existência. É olhar para além de si, sabendo-se passageiro diante de um
mundo maior que você mesmo. Ou até apenas tendo consciência de que não, eu não
tenho "todas as respostas dentro de mim", isso é conversa de quem
está em surto. Ninguém tem todas as respostas dentro de si.
Alguns têm em Deus e
em princípios religiosos seu "aster". Outros se pautam em princípios
éticos. Para alguns, os "aster" são as letras da lei. Podem ser dados
empíricos. Claro, não há garantia de que o sinal seja certeiro. Alguns
"aster" podem estar errados, ou só parcialmente certos.
Triste é quando você
não tem "aster" nenhum e segue tão somente seu próprio desejo. A vida
vira um breu. Não há nada que você considere maior que você, mais importante
que você. Quando se age assim, é a vitória da vaidade. Você se pensa um
"aster", e acha que não precisa observar e nem ouvir nada. Você até
pode convencer a si mesmo de que está agindo com sabedoria, mas é mentira. Você
está agindo por vaidade.
E é aí que surge
outra palavrinha grega: a húbris. Sugiro a pesquisa desta palavra, é bem
instrutiva e a Wikipedia tem verbetes razoáveis sobre isso tanto em português
quanto em inglês. Mas resumo dizendo que é quando alguém ou algo passou da
conta. Quando eu, em meu brilho ensandecido, jactante, não sigo mais sinal
algum além do brilho das minhas próprias certezas. E o resultado disso,
conforme bem aponta Eurípides, o resultado da húbris é a loucura.
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