Uma tendência enlouquecedora dos
eletrônicos de bolso é que quando a bateria está prestes a acabar eles gastam a
maior parte da energia remanescente bipando e piscando, nos avisando para
carregá-los.
Da mesma forma, o corpo humano tem
vários elementos que se autossabotam. Por exemplo, quando o oxigênio falta,
digamos ao tentar resgatar o tal eletrônico do fundo de uma piscina, o corpo
entra em modo de alerta, aumenta o batimento cardíaco, e assim queima o pouco
oxigênio disponível ainda mais rápido.
A mente também exibe esse tipo de
tolice. Ela tem o hábito cruel de esconder a sabedoria bem quando mais
precisamos. Há certas verdades que, quando estou em pânico, preciso realmente
lembrar, e é bem nesse momento que isso é mais difícil. Então pode ser útil
manter alguns lembretes bondosos à mão, já que da próxima vez que sentir
pânico, vai ser difícil lembrar esses pontos.
1. O mundo já acabou mil vezes
Não seria possível eu contar o número
de vezes que meu mundo já acabou. Pelo menos algumas dúzias de vezes na minha
vida me encontrei numa situação tão emaranhada e desesperadora que não
conseguia nem mesmo acreditar que algum dia voltaria a ser feliz.
De alguma forma, durante cada um
desses apocalipses pessoais, esqueci que em todas as vezes anteriores de alguma
forma as coisas se ajeitaram, e aqueles problemas hoje não são nem mais
relevantes.
Ainda assim, quando a catástrofe vem,
ela sempre parece prometer a morte ou pelo menos uma desfiguração completa da
totalidade da minha vida, e assim me sinto obliterado pelo desespero e pela
indignação. Se ao menos eu lembrasse que quase todos os problemas que tenho já foram solucionados, exceto
talvez dois ou três desenvolvimentos mais recentes... Mas é assim que a vida
segue.
São os problemas que seguem indo para
a forca, não eu.
Tenho certeza que seu mundo também já
acabou muitas vezes. A mente em pânico subestima a escala da vida humana e
assim calcula lá em cima a importância de qualquer problema em vista. Não se
engane.
2. Os problemas são os mesmos que todos os seres
humanos sempre tiveram
Você nunca descobrirá um jeito de
sofrer que já não tenha sido plenamente explorado. Coração partido, a morte de
pessoas amadas, doenças e velhice, dor crônica, vergonha, dependência de
substâncias, fracasso, pobreza e pesadelos introspectivos são reinos já
desbravados consistente e exaustivamente pelas pessoas ao longo de milhares de
anos, e em graus muitos piores com que hoje nos deparamos.No fundo, há apenas alguns poucos tipos de
problemas humanos, e todos eles já foram confrontados e sofridos em algum
momento.
A experiência da humanidade com o
sofrimento é um recurso disponível para cada um de nós, uma vez que para cada
problema humano clássico há um universo de literatura sobre as melhores formas
de lidar com as coisas que os outros humanos encontraram, e nunca foi tão fácil acessar essa sabedoria.
3. O desespero vem de uma crise dos pensamentos
sobre a vida, não de uma crise da vida
O sentimento de desespero cria uma
ilusão convincente. Nos faz pensar que tudo está acontecendo ao mesmo tempo,
mas isso não é bem possível. Enquanto que diversas condições de uma situação na
vida podem ocorrer ao mesmo tempo – digamos acúmulo de dívidas ao mesmo tempo
em que um relacionamento se desfaz – a vida ainda assim transcorre um momento de cada vez, e é bem raro que se precise fazer mais
do que uma coisinha a cada momento.
Cada questão pode exigir que se lide
com vários momentos difíceis, mas via de regra só se precisa lidar fisicamente
com um momento particular de cada vez. A sensação de que “tudo está acontecendo
ao mesmo tempo” é um fenômeno mental que não espelha a forma linear na qual se
desenrolam os problemas concomitantes.
Os pensamentos mudam muito mais
rapidamente do que os acontecimentos da vida, assim, um minuto de pensamentos
preocupados nos fazem vivenciar mentalmente uma dúzia de problemas.
É fácil se perder nesse reino
abstrato, pensando que demasiadas coisas estejam acontecendo “ao mesmo tempo”
para que nos decidamos sobre o que fazer, mas quando estamos prontos para
realmente lidar com um problema no mundo físico, podemos seguramente ignorar os
outros por um instante, enquanto lidamos com aquele específico.
4. É matematicamente improvável que os problemas
sejam tão ruins quanto parecem
A maioria das pessoas parece ser
pessimista. Eu mesmo certamente sofro dessa tendência e tenho paulatinamente me
recalibrado para um âmbito mais otimista.
De uma perspectiva evolutiva, é fácil
compreender porque tendemos a engendrar catástrofes a partir de nossas
dificuldades. Se fugimos de todas as cobras porque alguma delas pode ser
venenosa, é menos provável que morramos de mordida de cobra, ainda que passemos
85% do tempo fugindo de criaturas que deveriam estar fugindo de nós.
As tendências pessimistas ajudam na
autopreservação de forma geral, ao longo de uma vida inteira de situações
ambíguas, mas isso ao custo de elevar o estresse, e de nos fazer constantemente
fugir das coisas sem necessidade.
Saber que se é pessimista é saber que
as coisas geralmente são melhores do que parecem ser. Uma mente pessimista
muitas vezes cria uma imagem mental da situação que é muito mais perigosa e
difícil de resolver do que efetivamente se mostra na vida real.
E, para muitos entre nós, não se
trata de pequenos exageros com relação a seriedade de nossos desafios. Nas
muitas ocasiões em que percebi um erro no meu trabalho, geralmente isso se
expandiu rapidamente até a certeza de que eu tinha cometido um erro, que eu
seria descoberto e demitido, e que eu nunca mais conseguiria trabalhar nessa
carreira. Em meio minuto sofro um filme mental inteiro com meu corpo se
arrastando pelas calçadas num dia melancólico, entregando currículos para
gerentes de restaurantes de fast food.
Se esse reflexo mental soa familiar –
e se você entra em pânico frequentemente, é quase certo que soa – você
provavelmente é um pessimista, e assim pode quase sempre contar com a situação
ser bem mais fácil de lidar do que você inicialmente imaginou.
5. As coisas mudam bem rapidamente quando se começa
a fazer e não pensar tanto
A escuridão na mente da pessoa em
crise vem do sentimento de desespero, e o desespero vem da crença de que nada
que se faz importa. Embora esse sentimento seja comum, quase sempre não é
verdadeiro.
Não importa o quão ruins acabem por
ser as circunstâncias externas, provavelmente não serão tão terríveis quanto
Auschwitz, e mesmo naquele local, você poderia deparar com a grande descoberta
de Viktor Frankl —
a descoberta de que ninguém pode nos tirar a liberdade de escolher como nos
relacionamos com nossas circunstâncias.
Onde quer que se esteja, é possível
fazer algo para tornar o resto do dia melhor, e isso quer dizer que não se está
numa situação desesperadora. Não importa quão pequena seja a ação, uma vez que
se reconheça que se é capaz de melhorar a situação, o sentimento de desespero
não vai continuar, a não ser que se queira.
O desespero é uma aflição de
pensamentos confusos, e não tanto de circunstâncias confusas, e isso se torna
mais claro quando se começa a agir sobre as circunstâncias. Várias vezes ao
longo de minha vida vi um dia infernal se tornar tolerável no instante em que
dou um peteleco em pelo menos um de meus dilemas. Isso destrói a miragem de uma
catástrofe total, e assim fica difícil permanecer um mero participante passivo
do dia ruim.
6. É mais tentador não fazer as coisas quando mais
se precisa
Esse é outro hábito de autossabotagem
da mente humana normal. Há uma tendência para congelar quando as coisas começam
a parecer que vão descarrilhar, por duas razões.
A primeira razão é que tememos piorar
as coisas. O chão está sacudindo por toda parte, e em nosso evidente torpor de
incompetência não queremos pisar no lugar errado. Mas a razão principal é que
ao tomar a decisão de fazer algo, essa é a decisão de tomar responsabilidade
pela situação que nos encontramos, e isso não é um reflexo natural para a
maioria de nós.
Particularmente, quando acreditamos
que nosso problema é culpa de outra pessoa, é tentador esperar que pessoa
responsável assuma enfim sua responsabilidade. Isso não ocorre frequentemente,
e no mais das vezes estamos mesmo errados sobre quem botamos a culpa, de todo
modo. Sei que sempre quero que a culpa seja de outra pessoa, e não acho que eu
seja a exceção aqui.
Acreditar que o outro é responsável é
tentador porque nos deixa fantasiar um fim dedeus ex machina para
sua crise, a cavalaria que chega bem na hora, o que acaba sendo um filme bem
ruim porque faz o protagonista de bobo, e, na verdade, nunca acontece na vida
real.
Desafie a tentação de cruzar os
braços e esperar por alguma forma de salvação por justiça cósmica – ou pelo
menos lembre que haverá uma tentação de não fazer nada, bem no momento em que
se devia estar fazendo alguma coisa.
* * *
Este artigo foi
publicado originalmente no Raptitude e traduzido por Eduardo Pinheiro,
sob autorização do autor.
publicado em 05 de Setembro
de 2014, 21:01
Uma tendência enlouquecedora dos
eletrônicos de bolso é que quando a bateria está prestes a acabar eles gastam a
maior parte da energia remanescente bipando e piscando, nos avisando para
carregá-los.
Da mesma forma, o corpo humano tem
vários elementos que se autossabotam. Por exemplo, quando o oxigênio falta,
digamos ao tentar resgatar o tal eletrônico do fundo de uma piscina, o corpo
entra em modo de alerta, aumenta o batimento cardíaco, e assim queima o pouco
oxigênio disponível ainda mais rápido.
A mente também exibe esse tipo de
tolice. Ela tem o hábito cruel de esconder a sabedoria bem quando mais
precisamos. Há certas verdades que, quando estou em pânico, preciso realmente
lembrar, e é bem nesse momento que isso é mais difícil. Então pode ser útil
manter alguns lembretes bondosos à mão, já que da próxima vez que sentir
pânico, vai ser difícil lembrar esses pontos.
1. O mundo já acabou mil vezes
Não seria possível eu contar o número
de vezes que meu mundo já acabou. Pelo menos algumas dúzias de vezes na minha
vida me encontrei numa situação tão emaranhada e desesperadora que não
conseguia nem mesmo acreditar que algum dia voltaria a ser feliz.
De alguma forma, durante cada um
desses apocalipses pessoais, esqueci que em todas as vezes anteriores de alguma
forma as coisas se ajeitaram, e aqueles problemas hoje não são nem mais
relevantes.
Ainda assim, quando a catástrofe vem,
ela sempre parece prometer a morte ou pelo menos uma desfiguração completa da
totalidade da minha vida, e assim me sinto obliterado pelo desespero e pela
indignação. Se ao menos eu lembrasse que quase todos os problemas que tenho já foram solucionados, exceto
talvez dois ou três desenvolvimentos mais recentes... Mas é assim que a vida
segue.
São os problemas que seguem indo para
a forca, não eu.
Tenho certeza que seu mundo também já
acabou muitas vezes. A mente em pânico subestima a escala da vida humana e
assim calcula lá em cima a importância de qualquer problema em vista. Não se
engane.
2. Os problemas são os mesmos que todos os seres
humanos sempre tiveram
Você nunca descobrirá um jeito de
sofrer que já não tenha sido plenamente explorado. Coração partido, a morte de
pessoas amadas, doenças e velhice, dor crônica, vergonha, dependência de
substâncias, fracasso, pobreza e pesadelos introspectivos são reinos já
desbravados consistente e exaustivamente pelas pessoas ao longo de milhares de
anos, e em graus muitos piores com que hoje nos deparamos.No fundo, há apenas alguns poucos tipos de
problemas humanos, e todos eles já foram confrontados e sofridos em algum
momento.
A experiência da humanidade com o
sofrimento é um recurso disponível para cada um de nós, uma vez que para cada
problema humano clássico há um universo de literatura sobre as melhores formas
de lidar com as coisas que os outros humanos encontraram, e nunca foi tão fácil acessar essa sabedoria.
3. O desespero vem de uma crise dos pensamentos
sobre a vida, não de uma crise da vida
O sentimento de desespero cria uma
ilusão convincente. Nos faz pensar que tudo está acontecendo ao mesmo tempo,
mas isso não é bem possível. Enquanto que diversas condições de uma situação na
vida podem ocorrer ao mesmo tempo – digamos acúmulo de dívidas ao mesmo tempo
em que um relacionamento se desfaz – a vida ainda assim transcorre um momento de cada vez, e é bem raro que se precise fazer mais
do que uma coisinha a cada momento.
Cada questão pode exigir que se lide
com vários momentos difíceis, mas via de regra só se precisa lidar fisicamente
com um momento particular de cada vez. A sensação de que “tudo está acontecendo
ao mesmo tempo” é um fenômeno mental que não espelha a forma linear na qual se
desenrolam os problemas concomitantes.
Os pensamentos mudam muito mais
rapidamente do que os acontecimentos da vida, assim, um minuto de pensamentos
preocupados nos fazem vivenciar mentalmente uma dúzia de problemas.
É fácil se perder nesse reino
abstrato, pensando que demasiadas coisas estejam acontecendo “ao mesmo tempo”
para que nos decidamos sobre o que fazer, mas quando estamos prontos para
realmente lidar com um problema no mundo físico, podemos seguramente ignorar os
outros por um instante, enquanto lidamos com aquele específico.
4. É matematicamente improvável que os problemas
sejam tão ruins quanto parecem
A maioria das pessoas parece ser
pessimista. Eu mesmo certamente sofro dessa tendência e tenho paulatinamente me
recalibrado para um âmbito mais otimista.
De uma perspectiva evolutiva, é fácil
compreender porque tendemos a engendrar catástrofes a partir de nossas
dificuldades. Se fugimos de todas as cobras porque alguma delas pode ser
venenosa, é menos provável que morramos de mordida de cobra, ainda que passemos
85% do tempo fugindo de criaturas que deveriam estar fugindo de nós.
As tendências pessimistas ajudam na
autopreservação de forma geral, ao longo de uma vida inteira de situações
ambíguas, mas isso ao custo de elevar o estresse, e de nos fazer constantemente
fugir das coisas sem necessidade.
Saber que se é pessimista é saber que
as coisas geralmente são melhores do que parecem ser. Uma mente pessimista
muitas vezes cria uma imagem mental da situação que é muito mais perigosa e
difícil de resolver do que efetivamente se mostra na vida real.
E, para muitos entre nós, não se
trata de pequenos exageros com relação a seriedade de nossos desafios. Nas
muitas ocasiões em que percebi um erro no meu trabalho, geralmente isso se
expandiu rapidamente até a certeza de que eu tinha cometido um erro, que eu
seria descoberto e demitido, e que eu nunca mais conseguiria trabalhar nessa
carreira. Em meio minuto sofro um filme mental inteiro com meu corpo se
arrastando pelas calçadas num dia melancólico, entregando currículos para
gerentes de restaurantes de fast food.
Se esse reflexo mental soa familiar –
e se você entra em pânico frequentemente, é quase certo que soa – você
provavelmente é um pessimista, e assim pode quase sempre contar com a situação
ser bem mais fácil de lidar do que você inicialmente imaginou.
5. As coisas mudam bem rapidamente quando se começa
a fazer e não pensar tanto
A escuridão na mente da pessoa em
crise vem do sentimento de desespero, e o desespero vem da crença de que nada
que se faz importa. Embora esse sentimento seja comum, quase sempre não é
verdadeiro.
Não importa o quão ruins acabem por
ser as circunstâncias externas, provavelmente não serão tão terríveis quanto
Auschwitz, e mesmo naquele local, você poderia deparar com a grande descoberta
de Viktor Frankl —
a descoberta de que ninguém pode nos tirar a liberdade de escolher como nos
relacionamos com nossas circunstâncias.
Onde quer que se esteja, é possível
fazer algo para tornar o resto do dia melhor, e isso quer dizer que não se está
numa situação desesperadora. Não importa quão pequena seja a ação, uma vez que
se reconheça que se é capaz de melhorar a situação, o sentimento de desespero
não vai continuar, a não ser que se queira.
O desespero é uma aflição de
pensamentos confusos, e não tanto de circunstâncias confusas, e isso se torna
mais claro quando se começa a agir sobre as circunstâncias. Várias vezes ao
longo de minha vida vi um dia infernal se tornar tolerável no instante em que
dou um peteleco em pelo menos um de meus dilemas. Isso destrói a miragem de uma
catástrofe total, e assim fica difícil permanecer um mero participante passivo
do dia ruim.
6. É mais tentador não fazer as coisas quando mais
se precisa
Esse é outro hábito de autossabotagem
da mente humana normal. Há uma tendência para congelar quando as coisas começam
a parecer que vão descarrilhar, por duas razões.
A primeira razão é que tememos piorar
as coisas. O chão está sacudindo por toda parte, e em nosso evidente torpor de
incompetência não queremos pisar no lugar errado. Mas a razão principal é que
ao tomar a decisão de fazer algo, essa é a decisão de tomar responsabilidade
pela situação que nos encontramos, e isso não é um reflexo natural para a
maioria de nós.
Particularmente, quando acreditamos
que nosso problema é culpa de outra pessoa, é tentador esperar que pessoa
responsável assuma enfim sua responsabilidade. Isso não ocorre frequentemente,
e no mais das vezes estamos mesmo errados sobre quem botamos a culpa, de todo
modo. Sei que sempre quero que a culpa seja de outra pessoa, e não acho que eu
seja a exceção aqui.
Acreditar que o outro é responsável é
tentador porque nos deixa fantasiar um fim dedeus ex machina para
sua crise, a cavalaria que chega bem na hora, o que acaba sendo um filme bem
ruim porque faz o protagonista de bobo, e, na verdade, nunca acontece na vida
real.
Desafie a tentação de cruzar os
braços e esperar por alguma forma de salvação por justiça cósmica – ou pelo
menos lembre que haverá uma tentação de não fazer nada, bem no momento em que
se devia estar fazendo alguma coisa.
* * *
Este artigo foi
publicado originalmente no Raptitude e traduzido por Eduardo Pinheiro,
sob autorização do autor.
publicado em 05 de Setembro
de 2014, 21:01
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