Adriana Tanese Nogueira
Educação é o que fica após ter-se esquecido
tudo o que se aprendeu na escola.
Einstein
Essa é uma pergunta provocatória e até blasfema. Não quero generalizar, mas é preciso dizer o que parecer ser um padrão em muitos casos. Eu costumava ter pela instituição escola aquele respeito que o religioso tem pelo seu templo. Sim, para mim aprender e descobrir eram um prazer, como acredito piamente que é para toda criança desde que deixada à vontade para seguir a si mesma. É do ser humano esse tipo de tendência, tanto é que conseguimos sair da Idade da Pedra e estamos aqui escrevendo numa tela branca para um público invisível.
A curiosidade é humana e divina. Aprender a estudar, porém, são outros quinhentos. Aplicar-se e fatigar, disciplinar-se e perseverar... aí é caráter, não pano de fundo. Mas esse esforço fica mais fácil quando é levado pelo vento alegre da curiosidade e da descoberta... que ficam aonde nas escolas? Qual é o lugar do jogo descontraído do aprendizado espontâneo baseado na curiosidade e no interesse?
A pergunta é: quantas crianças gostam de ir à escola?
E destas, quantas gostam de ir à escola porque vão aprender coisas interessantes (e não para encontrar os amigos)?
Quantas crianças e jovens, afinal, posseum "amor pelo conhecimento"?
Enquanto no Brasil (e no mundo) há ainda anafalbetismo, do outro lado do espectro, quem vai à escola, encontra o que? Encontra um ensino padronizado que supõe um aluno padronizado. Não existe João, José e Maria. Existe "O Aluno", um "x" qualquer que tem que absorver o conhecimento "y" montado por um grupo de sujeitos "zzz" num lugar distante, num tempo que não é o presente que muda vertiginosamente.
E, nessa vida sem tempo de tantos pais, para que servem as escolas? Para estacionarem seus filhos enquanto eles tem que trabalhar para garantir a qualidade de vida que acham merecer ...e para pagar a escola do filho. Quanto mais psiquedélica a escola for mais satisfação dará ao sentimento de dever cumprido dos pais. Basta então continuar trabalhando o dia todo, chegar em casa à noite, dar comida e presentes ao filho, dar uma olhada no dever de casa (rapidamente, porque não se tem cabeça para mudar de canal mental e prestar verdadeiramente atenção ao que está lá), pôr o filho para dormir e sentir-se com a consciência em paz. Já foi feito o máximo. Nasceram o super pai e a super mãe.
Até o dia em que a criança apresenta algum problema. Ou talvez ela já está adulta e apresenta o problema só então. E o "problema" é que talvez ela não tenha aprendido nada de útil, ou nada que diz respeito ao que ela é, gosta, pensa e sente. Mas tem muitos amigos, isso sim. Numa sociedade onde o mérito é secundário e o Quem Indica primário pode até ser útil ter tantos amigos - se é que eles vão ser alguém na vida. Mas o pior de tudo é que nesse caminho padronizado, tão linear como o trilho de um trem, tão impessoal quanto o uniforme escolar, nessa longa jornada escolar a criança pode perder o gosto pelo saber, pode perder até mesmo a si mesma misturada entre gente que ela não entende porque não só não tem suficiente instrumentos cognitivos como porque ela não sabe quem ela mesma é.
Socializar é importante, dizem os pais responsáveis. Verdade. Entretanto, nenhum desses pais se obrigariam a permanecer na companhia de pessoas desagradáveis, agressivas, burras e caóticas. Qualquer pessoa sã de mente se afasta de quem a prejudica. Mas não se dá às crianças essa oportunidade. Elas devem engolir tudo e ainda chamar a todos de "amiguinho".
A confusão sobre o que é justo e injusto, o que abusivo e o que é verdadeiro, o que ela sente e o que ela "tem que sentir" se instalará na criança desde muito cedo, sabotando o desenvolvimento espontâneo e livre de sua personalidade. Porque, se as reações espontâneas da criança são reprimidas em nome de ser "bons" ou de uma ética abstrata imposta por adultos que padronizam e não sabem olhar para criança e enxergá-la de verdade, então a criança estará sendo educada a desconfiar de si mesma, desconsiderando o que sente e pensa, e nivelando-se ao grupo.
"Mas no mundo, um adulto convive com pessoas que ele não gosta, logo a criança deve aprender a fazer o mesmo!" Replicam os pais que sabem do que falam. Verdade. Mas esses pais são adultos e sabem reconhecer um subjeito mal encarado, sabem quando precisam blefar, disfarçar e desviar golpes. Estão conscientes, tanto é que podem chegar em casa e dizer: "Tive que passar duas horas com o tal imbecil!" Uma criança chega m casa e não sabe é ela a imbecil ou o outro e a revolta que chegam a sentir fica muda no peito ou desafoga no videogame e no hard rock. A criança não tem, por idade, uma personalidade formada e está sujeita a estímulos ambíguos (o que no mundo adulto dizemos que está sujeita à hipocrisia, ignorância e falsidade) e manipulatórios não saberá discernir o que é dela e o que é dos outros. Sua personalidade surgirá em meio a "n" estímulos e pelo efeito mecânico do encontro e desencontro, das batidas e dos acidentes entre outros confusos vindos de ambientes diversos e, para a criança, incompreensíveis. Não tendo alguém com quem fazer o trabalho de discernimento do que aconteceu, do por quê e do como, do que sentiu e do que pensou, a criança cresce confusa, tentando fazer acrobacias para sobreviver sem saber para onde está indo e quem está se tornando. Ela está confusa sobre sua própria identidade e segue a tendência natural a buscá-la no grupo. Quando não se tem personalidade formada a adesão ao grupo significa sempre submissão ao coletivo.
É disso que precisamos no século XXI?
São os grupos que fazem a história ou não são os indivíduos? Não é pela homogeneidade estúpida dos grupos que gente como Hitler encontrou apoio e sucesso? Não é pela genialidade individual que a humanidade avançou? Não é pela coragem dos que desafiaram os grupos que evoluímos?
Hoje em dia temos informação em todo e qualquer canto da nossa vida. É só acessar. É só ter vontade de saber. Melhor: é só saber o que se quer. Para saber o que se quer, porém, precisa saber quem e o que se é.
A escola permite isso? Estimula a individualidade, a auto-descoberta e o desabrochar dos talentos pessoais?
Num mundo complexo e complicado como o nosso, o que há de mais precioso do que o senso crítico e saber pensar para se orientar?
E a escola realiza isso?
Fonte: Para que servem as escolas?
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